Mahmundi e Karina Dias: uma conversa possível sobre cores e paisagens
A paisagem como forma de visualizar e contemplar o mundo

A ideia de paisagem é uma invenção pictórica. Lá pelo século XIV pintores italianos começavam a esboçar esse conceito. O percurso imagético do que viria a ser uma paisagem vem acompanhado pela moldura que as janelas forneciam as cenas exteriores. Assim, a paisagem se apresenta como um recorte de vista, ou como a artista plástica Karina Dias propõe, como um ponto de contato, a paisagem se coloca como uma “espécie de aparição”. Os recortes da janela acabam por abarcar os sons, as temperaturas, as distâncias, aspectos tão fortes dentro do EP Efeito das Cores de Mahmundi.
Em 2012, Marcela Vale lançou seu primeiro trabalho solo; gravado em seu quarto, na zona norte do Rio de Janeiro. Nesse trabalho as interferências da paisagem externa são encaradas como partes constituintes da sonoridade apresentada. É possível ouvir o barulho do trem; os vocais por vezes parecem distantes e abafados. Porém, essas questões não tornam o trabalho menos denso ou relevante.
A carioca entregou músicas cheias de sonhos, de mar, de azul, de alegria e de compartilhamento. Apresentou a muitas pessoas a possibilidade de ser um “habitante-artista-habitante” (ideia apresentada por Karina em seu trabalho Tempo Paisagem; a brasiliense pesquisa poética da paisagem e da viagem, em estudos sobre a noção de horizonte e na geopoética).
Algumas das canções presentes no EP acabaram entrando nos discos posteriores da cantora, e nesse histórico musical é possível se deliciar com a construção sonora que cresce à medida que os instrumentos de trabalho se aperfeiçoam. A carreira de Mahmundi carrega músicas que são reapresentadas, que fazem parte sua trajetória e acabam por ser parte da paisagem de sua vida.
Paisagem não é apenas aquilo que o campo da visão alcança, é uma forma de enxergar o que nos cerca por meio da nossa subjetividade.
Marcela construiu em Efeito das Cores uma imensidão de mar, com todos os detalhes que nos ocorre observar quando o vemos – pensando naqueles que já viveram esse encontro e gravam em si uma memória, afetiva ou não, com a imensidão de tal espaço.
As narrativas discorrem a partir de cenas cotidianas, ou de sensações vividas nos dias que se passam. A experiência da paisagem ganha espaço na poética de Mahmundi, ali onde o cotidiano ganha relevo e se eleva aos olhos.
Embora Karina e Marcela se aproximem do cotidiano a fim de explorar a singularidade do que é vivido, esse movimento se dá de forma particular, ou parafraseando Dias, esse recorte sobre o que se vê é uma maneira de enxergar as epifanias cotidianas que contornam o olhar.